sexta-feira, 26 de janeiro de 2024

O poder dos introvertidos num mundo que não pára de fala

Pelo menos um terço das pessoas que conhecemos é introvertido. É aos introvertidos que devemos muitos dos grandes contributos para a sociedade - dos girassóis de Van Gogh à invenção do computador pessoal, de Lewis Carroll até Gandhi, passando por Albert Einstein, não faltam na história da Humanidade introvertidos célebres.

As pessoas introvertidas são as que preferem ouvir a falar, ler a socializar; que inovam e criam, mas não gostam de se autopromover; que privilegiam o trabalho solitário às sessões e aos locais com muita gente.

Uma obra que revoluciona nossa concepção de personalidade. Introvertidos são homens e mulheres que preferem ouvir em vez de falar, trabalham melhor sozinhos do que em equipe e, muitas vezes, são discretos sobre seus méritos e conquistas. Em um mundo que promove o ideal extrovertido, chegou a hora de reivindicar as virtudes da introversão, fundamentais para o progresso da sociedade. Com esta obra lúcida, Susan Cain bane alguns preconceitos e estabelece um elogio justificado e documentado às pessoas introvertidas, que são mais criativas, determinadas e desfrutam de um mundo interior mais rico e descontraído. Uma obra que vai revolucionar a nossa concepção de personalidade.  


Para saber mais: AQUI




Esto es Amor ( Lope de Vega)

 Esto  es Amor ( Lope de Vega) 

(encontrei este poema na parede de uma rua de Zamora) 

Desmayarse, atreverse, estar furioso,

áspero, tierno, liberal, esquivo,

alentado, mortal, difunto, vivo,

leal, traidor, cobarde y animoso;


no hallar fuera del bien centro y reposo,

mostrarse alegre, triste, humilde, altivo,

enojado, valiente, fugitivo,

satisfecho, ofendido, receloso;


huir el rostro al claro desengaño,

beber veneno por licor süave,

olvidar el provecho, amar el daño;


creer que un cielo en un infierno cabe,

dar la vida y el alma a un desengaño;

esto es amor, quien lo probó lo sabe. 




quinta-feira, 25 de janeiro de 2024

Lou Salomé

 Ouse, ouse... ouse tudo!!

Não tenha necessidade de nada!

Não tente adequar sua vida a modelos,

nem queira você mesmo ser um modelo para ninguém.

Acredite: a vida lhe dará poucos presentes.

Se você quer uma vida, aprenda... a roubá-la!

Ouse, ouse tudo! Seja na vida o que você é, aconteça o que acontecer.

Não defenda nenhum princípio, mas algo de bem mais maravilhoso:

algo que está em nós e que queima como o fogo da vida!!

LOU SALOMÉ 

na fotografia, Lou Salomé com Rilke (de livro na mão) e amigos  





Privatizações

 Se algum dia privatizarem o ar, haverá sempre um idiota que te diga:

«- Se criticas tanto o capitalismo, então porque é que respiras?»




Não há maior tirania do que aquela que se exerce sob a capa da lei, e em nome da justiça

 Não há maior tirania do que aquela que se exerce sob a capa da lei, e em nome da justiça

Montesquieu

Il n'y a point de plus cruelle tyrannie que celle que l'on exerce à l'ombre des lois et avec les couleurs de la justice



terça-feira, 23 de janeiro de 2024

A atenção face ao speed watching

 A morte da ATENÇÃO humana...

...com o speed watching

O you tube e outros motores de busca da internet permitem agora o visionamento das séries de TV e dos filmes em modo acelerado, aumentando de 20 a 50% a velocidade das imagens. 

Um episódio que durava 52 minutos pode ser visto em 39 minutos. Tudo isso significará o desaparecimento ou a morte progressiva da atenção 


Ler AQUI 



Os Amigos ( poema de Eugénio de Andrade)

 Os Amigos 

Os amigos amei 

despido de ternura 

fatigada; 

uns iam, outros vinham, 

a nenhum perguntava 

porque partia, 

porque ficava; 

era pouco o que tinha, 

pouco o que dava, 

mas também só queria 

partilhar 

a sede de alegria — 

por mais amarga. 

Eugénio de Andrade, in "Coração do Dia"  




Despolitização

 A despolitização tem várias faces. 

A mais comum é das pessoas que votam sem saber o que estão a fazer. 

Uma segunda traduz-se em insistir que as ideologias já terminaram, e que a política e os políticos  são todos  iguais.

Finalmente, encontramos uma outra, não menos vulgar,  que não cessa de emitir  juízos políticos sobre tudo e mais alguma coisa, fulanizam (falam de pessoas, e não de  ideias nem de projetos ou programas políticos), mas que revelam o mais completo desconhecimento  da coisa pública, da ciência e da filosofia políticas.

É por isso que é tão urgente o esclarecimento e o estudo para não cair na mesma situação de milhões de cristãos que não fazem a mínima ideia do que é, e em que consiste, o cristianismo.

 Infelizmente, a escola não tem ajudado a promover  a educação para a cidadania ativa e crítica





Para que serve a filosofia, a arte e a literatura ( Shakespeare )

 Se a literatura, a arte, a ciência, em suma, a filosofia, não ajudarem a criar uma Julieta ou a revogar as ordens e as sentenças de um príncipe, de nada servem:

«Que se enforque a filosofia! 

Se essa filosofia não pode criar uma Julieta, mudar de lugar uma cidade, revogar a sentença dum príncipe, de nada  serve, de nada vale”

( in “Tragédia de Romeu e Julieta” de Shakespeare)


Hang up philosophy!

Unless philosophy can make a Juliet,

Displant a town, reverse a prince's doom,

It helps not, it prevails not: talk no more.  





Diário de William Beckford em Portugal e Espanha

 O trágico é que toda esta realidade de ameaças e orações ainda é a mesma nos nossos dias, senão leiam:

«O pobre pequeno é educado o mais possível dentro de casa e estritamento. Vive num espaço acanhado e obrigam-no a trabalhos forçados, com uma média de oito a nove lições por dia. Em vez de o encorajarem a remar no rio, a jogar o cricket ou a correr no jardim com as crianças da sua idade, passa a vida engaiolado com um rebanho de desdentadas amas e de inválidos capelões, todos a trabalhar para o mesmo fim, que é apoucar-lhe o espírito com ameaças e orações.»

Diário de William Beckford em Portugal e Espanha





Ursula K. Le Guin

 Sabem? Os livros não são apenas mercadorias . O desejo de lucro entra frequentemente em conflito com os objetivos da arte.Nós vivemos no sistema capitalista, e os seus poderes parecem ser ilimitados, mas o mesmo se pensava anteriormente sobre o direito divino dos Rei Qualquer poder imposto pelos seres humanos pode sofrer a resistência e ser alterado pelos seres humanos. A resistência e a mudança começam muitas vezes na arte, e muito frequentemente na nossa arte − a arte das palavras.

Ursula K. Le Guin


Books, you know, they’re not just commodities. The profit motive often is in conflict with the aims of art. We live in capitalism. Its power seems inescapable. So did the divine right of kings. Any human power can be resisted and changed by human beings. Resistance and change often begin in art, and very often in our art—the art of words.”






Odonianismo ( Ursula K. Le Guin )


«Odonianismo é o anarquismo. Não o bombismo terrorista, qualquer que seja o nome que se lhe dê, nem o darwinismo social dos libertarianos da extrema direita; mas o anarquismo prefigurado muito cedo no pensamento taoísta, e exposto por Shelley, Kropotkin, Goldman e Goodman. O principal alvo do anarquismo é o Estado autoritário (capitalista ou socialista); e o seu princípio moral do comportamento é a cooperação (solidariedade, ajuda mútua). É a mais idealista, e para mim a mais interessante, de todas as teorias políticas»

Ursula K. Le Guin





Greve dos Tecelões do Porto que se tornou numa greve ger

A greve começou numa fábrica na Rua do Bonjardim a 6 de Junho de 1903. Espalhou-se a outras fábricas de tecelões e, depois, a dezenas de milhares de operários de todos os sectores.

A jovem trabalhadora Infantina Rosa foi presa, tendo declarado que trabalhava  «das 7 às 7, são 14 horas por dia, com   uma hora  para jantar, mas que às vezes é roubada» .

Com esta greve, os operários inundaram as ruas da cidade e mostraram a miséria e a fome de que sofriam, tendo conquistado o apoio da população em geral que se  comoveu com as crianças  e as famílias operárias famintas.

Polícia e tropa reprimiram grevistas junto das fábricas, nas ruas, nas ilhas. Estes respondiam à pedrada.

Seria, até aqui, uma greve normal, mas o movimento social grevista, com esplêndida organização e adaptada à situação, garantiu o apoio da imprensa diária do Porto; ocupou o espaço público central da cidade; expôs a miséria e a fome em que os operários vivam:; adoptou a não-violência, que paralisou a repressão; negociou   com os industriais de igual para igual; mobilizou a solidariedade dos cidadãos do Porto e do país;  e conseguiu a vitória nas principais reivindicações.

Foi a maior greve até então em Portugal, uma greve geral como nunca se tinha vivido, mas a sua memória perdeu-se, porque os vencedores de então, os anarquistas, foram depois vencidos.     

Fonte: AQUI 




Deleuze

 O sistema quer que sejamos tristes, por isso é preciso sermos alegres para lhe resistir

                                                                    G. Deleuze



ContraNarciso ( e o narcisismo imperante e egocêntrico) - poema de Paulo Leminski

 em mim

eu vejo o outro

e outro

e outro

enfim dezenas

trens passando

vagões cheios de gente

centenas

o outro

que há em mim

é você

você

e você

assim como

eu estou em você

eu estou nele

em nós

e só quando

estamos em nós

estamos em paz

mesmo que estejamos a sós

Paulo Leminski 





Educação popular através da prática desportiva

 

Educação popular através da prática desportiva e da atividade cultural

pode favorecer o reforço dos laços sociais, a autonomia e a emancipação





A violência não é instaurada pelos oprimidos (Paulo Freire )

Como poderiam os oprimidos dar início à violência, se eles são o resultado de uma violência? Como poderiam ser os promotores de algo que, ao instaurar-se objetivamente, os constitui? 

Não haveria oprimidos, se não houvesse uma relação de violência que os conforma como violentados, numa situação subjetiva de opressão.

Inauguram a violência os que oprimem, os que exploram, os que não se reconhecem nos outros; não os oprimidos, os explorados, os que não são reconhecidos pelos que os oprimem como outro. 

Inauguram o desamor, não os desamados, mas os que não amam, porque apenas se amam. 

Os que inauguram o temor não são os débeis, que a eles são submetidos, mas os violentos que, com seu poder, criam a situação concreta em que se geram os “demitidos da vida”, os esfarrapados do mundo. 

Quem inaugura a tirania não são os tiranizados, mas os tiranos.

Quem inaugura o ódio não são os odiados, mas os que primeiro odiaram.

Quem inaugura a negação dos homens não são os que tiveram a sua humanidade negada, negando também a sua. 

Quem inaugura a força não são os que se tornaram fracos sob a robustez dos fortes, mas os fortes que os debilitaram.





Quando em teu colo deitei a cabeça - Walt Whitman (1819-1892)

 Quando em teu colo deitei a cabeça, meu camarada, 

a confissão que fiz eu reafirmo,

o que eu te disse e a céu aberto 

eu reafirmo: sei bem que sou inquieto 

e deixo os outros também assim, 

eu sei que minhas palavras são armas 

carregadas de perigo e de morte, 

pois eu enfrento a paz e a segurança 

e as leis mais enraizadas 

para as desenraizar, 

e por me haverem todos rejeitado 

mais resoluto sou

do que jamais poderia chegar a ser 

se todos me aceitassem,

eu não respeito e nunca respeitei 

experiência, conveniência, 

nem maiorias, nem o ridículo, 

e a ameaça do que chamam de inferno 

para mim nada é, ou muito pouco, 

meu camarada querido: eu confesso 

que o incitei a ir em frente comigo 

e que ainda o incito sem a mínima idéia 

de qual venha a ser o nosso destino 

ou se vamos sair vitoriosos 

ou totalmente sufocados e vencidos.





Somaterapia ou Soma

Somaterapia é uma terapia corporal e em grupo criada no Brasil pelo escritor e terapeuta Roberto Freire,  baseada na teoria de Wilhelm Reich, discípulo dissidente de Freud,  e no Anarquismo. 

A Soma entende o conflito neurótico - que gera conflitos e depedências - a partir das relações de poder presentes em vários níveis da sociedade. Assim, o anarquismo com ética filosófica procura permear a metodologia da Soma, permitindo a identificação do autoritarismo nas relações inter-pessoais.

 Além da teoria reichiana, a Soma também adopta a  Gestalt-terapia e as descobertas sobre a pragmática da comunicação humana   

A Somaterapia ou apenas Soma é um processo terapêutico em grupo, com ênfase na articulação entre o trabalho corporal e o uso da linguagem verbal. Utiliza ainda os conceitos de organização vital da Gestalterapia; os estudos sobre a comunicação humana da Antipsiquiatria e a arte-luta da Capoeira Angola. Eles servem como ferramentas que auxiliam as pessoas na elaboração de vidas mais livres e afirmativas.


O grupo funciona como um micro-laboratório social, no qual desenvolvemos uma analítica libertária do comportamento de cada um e sua relação junto ao outro. O processo dura até um ano e meio, com encontros periódicos (são quatro sessões mensais). A originalidade da Soma como terapia libertária está na vivência das práticas de liberdade como contraponto às relações sociais hierarquizadas e sua produção de subjetividades adoecidas.   

Website: AQUI  




segunda-feira, 22 de janeiro de 2024

Lord Byron (22 de janeiro de 1788 — 19 de abril de 1824)

 There is a pleasure in the pathless woods, 

There is a rapture on the lonely shore, 

There is society, where none intrudes, 

By the deep sea, and music in its roar: 

I love not man the less, but Nature more




Assalto ao navio Santa Maria (22 Janeiro de 1961)

 Foi há 63 anos

O navio  transatlântico "Santa Maria" foi tomado de assalto na madrugada de 22 de janeiro de 1961 por um punhado de 23 exilados políticos portugueses e espanhóis como desafio aos regime fascistas de Salazar  e de Franco

O navio foi rebaptizado "Santa Liberdade".






As manifestações mediáticas da política são para retardados ou a infantilização do eleitor

 «O que resta da política, tal como ela se apresenta nas suas manifestações mediáticas, é uma coisa sem nome para indivíduos tratados como intelectualmente retardados ou como crianças. O regime de infantilização do eleitor tornou-se uma regra, um jogo a que todos se vão acomodando. »

António Guerreiro, in Público 22/1/2016  

Para ler a crónica completa:

O carnaval político 

Foi um processo rápido e identificável numa geração (aceitando que o tempo de uma geração são 30 anos, por mais que a obsessão pelos “balanços” tenha vulgarizado uma ideia muito pouco rigorosa de geração), aquele que conduziu às campanhas eleitorais feitas segundo o modelo do carnaval. Mas a carnavalização a que assistimos desencantados é muito imperfeita, fica-se pelo mimetismo de algumas manifestações de superfície, longe de conseguir a inversão dos signos que é fundamental no rito carnavalesco: a Morte que se transforma em Vida, o Baixo que é tomado pelo Alto, o Ignóbil pelo Nobre, o assunto sério que se torna objecto do riso. O carnaval, nos seus rituais antigos, instaura um tempo da festa e cria um mundo alternativo; as eleições, pelo contrário, já não têm o poder de interrupção do tempo profano e não conseguem impor um espaço simbólico que faça concorrência ou transtorne o real. A carnavalização torna-se assim um espectáculo triste, às vezes grotesco. Ao ponto de, se aderimos a um candidato, evitarmos olhá-lo nas representações de bouffon a que ele inevitavelmente se presta. Reservamos o prazer de espectadores da palhaçada olhando para os candidatos concorrentes. Ou então fazemos um esforço para compreender melhor o que se passa e absolvemos com maior ou menor benevolência os protagonistas da carnavalização: o que se passa é que a campanha é o momento em que se exibem sem filtros nem pudor os restos da política, em que esta se torna objecto de uma comemoração mortífera (um carnaval tétrico) da sua condição espectral, isto é, da sua condição mediática, muito especialmente televisiva. A televisão tornou-se um encenador do carnaval político e de muitos outros carnavais. A antiga magia do pequeno ecrã está hoje limitada à encenação de um ininterrupto e pindérico carnaval. E é só isto, o espectáculo carnavalesco, que resta da política? Não. Temos também, para ajudar à festa, um outro factor coercivo: o princípio anti-político da “força das coisas”. O que resta da política nestes momentos festivos do jogo eleitoral é pouco mais do que a urgência da questão sobre o que fazer com o que resta da política, muito embora seja hoje um anacronismo recitar a ideia sartriana das “Élections, piège à cons” (ou seja, “Eleições, armadilha para idiotas”). A lógica da carnavalização significa a impossibilidade de uma repolitização do espaço político. O que resta da política, tal como ela se apresenta nas suas manifestações mediáticas, é uma coisa sem nome para indivíduos tratados como intelectualmente retardados ou como crianças. O regime de infantilização do eleitor tornou-se uma regra, um jogo a que todos se vão acomodando. Ele é cúmplice de um discurso hegemónico a que se chama “comentário político” e cujo modelo tanto é a palestra didática do mestre-escola sobre as margens anedóticas da política, como um divertimento à volta das manobras tácticas do jogo político. Há em todo este fenómeno — que ora é popular, ora é infantilizante, ora é carnavalesco — um autoritarismo doce e invasivo. Esta subcultura já forneceu matéria para um debate sobre os fascismos sem fascismo, sobre novas formas de fascismo que não são incompatíveis com as democracias liberais do nosso tempo. Este “novo fascismo”, profetizado por Pasolini, apresenta-se sob a forma de uma verdadeira política da felicidade e tanto pode ser identificado na transformação da política em entretenimento como numa “nova cultura” empresarial. Desta campanha eleitoral que hoje termina, o que sobra são os restos da política. Já nem é sequer a questão: o que resta da política?

https://www.publico.pt/2016/01/22/culturaipsilon/opiniao/o-carnaval-politico-1721063





Elinor Ostrom (Prémio Nobel da Economia) contra o mito da tragédia dos comu

Elinor Ostrom, Prémio Nobel da Economia em 2009, desafiou a teoria de Garrett Hardin (“The Tragedy of the Commons”) demonstrando a possibilidade de uma nova forma de gerir recursos comuns, em comunidade e de modo sustentável. 

 Contrariamente a Hardin, Ostrom prova-nos que um conjunto de bens comuns a vários indivíduos não é necessariamente mal gerido pelos seus utilizadores e que a privatização ou regulação por entidades externas não são as únicas, nem as soluções mais eficientes, para a gestão  sustentável dos recursos.

A teoria apresentada pela autora (“Common Pool Resource”) baseou-se em inúmeros  estudos empíricos com populações que realizam, com sucesso, a própria gestão de recursos comuns, como é o caso de stocks de peixes, pastos, bosques, lagos e bacias hidrográficas, entre outros.  

Ostrom concluiu que os resultados, neste tipo de gestão, são mais eficientes que o previsto pela teoria de Hardin, e que nestas comunidades o comportamento dos agentes distancia-se do egoísmo e individualismo apresentado na abordagem de Hardin  




 O grande  inimigo da arte é o bom gosto

 ( Le grand ennemi de l'art, c'est le bon goût. ) 

Marcel DUCHAMP




domingo, 21 de janeiro de 2024

 ÀS VEZES UM GRITO É MELHOR QUE UMA TESE 

Ralph Waldo Emerson


(sometimes a scream is better than a thesis.)


Ler:  AQUI                                                                




quinta-feira, 18 de janeiro de 2024

Faz hoje 90 anos que aconteceu a insurreição operária do 18 de Janeiro contra a ditadura fascista de Salazar

Em 1934, os trabalhadores organizados na na velha CGT/AIT fizeram uma greve geral insurreccional para derrubar Salazar, que tinha tomado o poder anos antes e tinha adoptado o fascismo como forma de poder ditatorial

A greve contra a fascização sindical teve particular impacto em Lisboa, Marinha Grande, Almada, Silves e outras localidades.

Na Marinha Grande foi ocupado o posto da GNR e organizado o soviete da vila. 


O 18 de Janeiro de 1934 foi um dia histórico na história do movimento operário e da luta e resistência contra a Ditadura fascista de Salazar por ter sido nessa data que se registou um movimento grevista insurreccional operário e camponês contra a política salazarista de cerceamento das liberdades e direitos dos trabalhadores e das suas associações sindicais, e que visava igualmente o derrube daquele regime, movimento esse que teve impacte especial na Marinha Grande onde os operários vidreiros conseguir tomar a localidade, desafiando e resistindo às forças da repressão que foram lançadas contra os trabalhadores.


Todas as correntes do movimento operário participaram, destacando-se no entanto os militantes da CGT, a maior confederação sindical anarco-sindicalista durante o período da I República ( 1910-1926) e que ofereceu uma resistência persistente contra a fascistização dos sindicatos e da sociedade portuguesa, não obstante a repressão e a perseguição que se abateu sobre si e os seus dirigentes e militantes.

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Recorde-se que o movimento operário de 18 de Janeiro de 1934, foi uma acção desencadeada pelas organizações operárias contra a fascização dos sindicatos que a ditadura fascista de Salazar queria obrigatoriamente vincular ao sindicalismo fascista. Para isso havia sido elaborado o decreto 23.050 de Setembro de 1933, que obrigava à dissolução e encerramento dos Sindicatos Nacionais e à sua agregação compulsiva ao Corporativismo até ao dia 31 de Dezembro desse ano de 1933.

As Associações Sindicais de classe reagiram preparando uma greve geral. Secretamente, preparava-se também uma insurreição armada visando o derrube da ditadura, que viria a falhar, revestindo-se numa grave e pesada derrota para o operariado e suas organizações de classe.

Foi na Marinha Grande que o 18 de Janeiro de 1934 teve o seu expoente máximo, pelo cumprimento total das missões previamente atribuídas ao operariado local. Foi tomado o posta da Guarda Nacional Republicana, a estação dos Correios e a então ainda vila isolada por cortes das comunicações terrestres e telefónicas.

Embora efemeramente, os operários foram senhores absolutos da então ainda não cidade, tendo reaberto o seu sindicato.

Com a chegada de meios militares de Leiria, seriam derrotados, presos na Trafaria (margem esquerda do rio Tejo junto à sua foz) e, posteriormente,, deportados cerca de quarenta operários vidreiros, primeiro para Angra do Heroísmo (Açores) e alguns para o campo de concentração do Tarrafal, tristemente celebrizado por "campo da morte lenta" com processos trazidos da Alemanha fascista.

Desses deportados da Marinha Grande, três morreriam no degredo: António Guerra, Augusto Costa e Francisco da Cruz.

Nessa madrugada de 18 de Janeiro de 1934 deflagraram outros focos de rebelião contra o regime fascista, como o descarrilamento de um combóio em Santa Iria da Azóia (perto de Lisboa), rebentamento da central eléctrica de Coimbra e bombas em Silves (Algarve) e Barreiro (perto da Trafaria), em acções sem grande coordenação que provocaram centenas de prisões entre dirigentes associativos e sindicais 



Para saber mais:  AQUI




Sindicatos contra o fascismo (“Greve Geral Revolucionária de 18 de Janeiro de 1934”)

 Em 1934, uma “Frente Única” formada pela CGT (anarquista), CIS (comunista), FAO (socialista) e pelos Sindicatos autónomos –, e com apoio do Partido Comunista -, desencadeou a “greve geral revolucionária”, que saiu à rua às 3 horas da manhã do dia 18 de janeiro. Na origem está, especialmente, a luta contra a “fascização dos sindicatos”, para além de reivindicações económicas.

Porém, discordâncias quanto à estratégia e dificuldades materiais de vária ordem, foram atrasando o desencadear da greve, que esteve marcada para 8 e 9 de janeiro. 

Este arrastamento da preparação foi decapitando o movimento. Mário Castelhano, líder dos anarquistas, é preso em 14 de janeiro e, ENTRE 11 e 17 de JANEIRO, FORAM APREENDIDAS BOMBAS E PRESOS TODOS OS IMPLICADOS DO COMITÉ SINDICAL DE SETÚBAL.

A Greve teve especial relevância em Coimbra, Marinha Grande, Leiria e em Lisboa, na Outra Banda (Seixal, Barreiro, Almada) e entre os corticeiros de Silves.

A partir das primeiras horas de dia 18, sucederam-se cortes de linhas de telégrafo e telefone e sabotagens de meios de comunicação. A mais marcante ocorreu na Póvoa de Sta. Iria: um comboio de mercadorias descarrila e vê destruídas 23 das suas 52 carruagens.

Os defensores do “sindicalismo livre” são severamente castigados: despedidos das empresas, presos e deportados. Uma das colónias mais numerosas do Campo de Concentração do Tarrafal é composta por sindicalistas do “18 de Janeiro”


ANEXO: Resumo do processo da PVDE 20/934, de José Bernardo (ou “José dos Cabritos”) e outros (catorze)

Este processo decorreu entre 11 de janeiro de 1934 e 10 de outubro do mesmo ano, embora ainda tivesse havido lugar a recurso de um dos réus, cujo indeferimento foi dado a conhecer no mês seguinte, a 7 de novembro. 

Os dois principais arguidos, José Bernardo e António Augusto Quaresma, eram soldadores da indústria conserveira e lideravam, com Augusto Reis “Grelheiro” e Jaime Rebelo, todos anarco-sindicalistas, o “Comité Grevista Revolucionário de Setúbal”. 

Os quinze elementos começaram a ser capturados a 11 de janeiro; no entanto, alguns conseguiram pôr-se em fuga, tendo sido presos ao longo dos anos de 1936 e 1937, depois de sucessivos mandados de captura falhados, pelo que o julgamento de Augusto Reis “Grelheiro”, Bernardino Augusto Xavier, Manuel da Graça e Jorge da Silva se desenrolou à revelia. 

Na sua fase inicial, o processo foi organizado pela Secção de Investigação do Comando da Polícia de Segurança Pública de Setúbal, tendo depois transitado para a PVDE antes de ser presente a julgamento no Tribunal Militar Especial de Lisboa. As primeiras investigações da polícia ocorreram depois do lançamento de uma bomba de dinamite, muito potente, no sítio do Moinho Novo, em Setúbal, a 7 de janeiro de 1934, ao mesmo tempo que eram lançados manifestos revolucionários em várias ruas da cidade. Na sequência destes acontecimentos, a PSP prendeu para investigações José Bernardo e António Augusto Quaresma, na base da presunção de que a bomba só poderia ter sido “lançada por elementos perturbadores e perigosos [à atual] situação política, por desafetos à mesma” – nas alegações da polícia.

António Augusto Quaresma foi capturado por haver suspeitas de ter sido o lançador da bomba, “tanto mais que era tido por perigoso comunista”. Nas inquirições policiais declarou-se anarquista, mas negou, num primeiro auto de perguntas, o lançamento da bomba. Nas suas habituais reuniões num café da Praça do Bocage, com Jaime Rebelo e outros, apenas tinham tratado da “crise de trabalho e do próximo defeso da pesca da sardinha”. De seguida é ouvido José Bernardo e surgem as primeiras incongruências nas declarações dos dois anarquistas. A polícia promove a acareação de ambos e, três dias depois, a 14 de janeiro, os dois conserveiros viam-se obrigados a confessar. Denunciam Augusto Reis Grelheiro, operário da fábrica “Algarve Exportadora” de ser detentor das bombas e Jorge Alves Raposo, um ferroviário do Barreiro, de ser o seu transportador a partir daquela vila – onde tinham sido confecionadas -, para Setúbal, ao longo do anterior mês de dezembro. 

Nesse mesmo dia, em auto de busca e apreensão, foram apreendidas 59 bombas de choque, “de grande potência”, na casa de Augusto Grelheiro que, entretanto, se pusera em fuga. Apertado pela polícia, José Bernardo confessou que as bombas se destinavam a “um próximo movimento revolucionário de carácter comunista, com ligações aos partidos políticos”. Tudo tinha sido combinado depois “do encerramento do sindicato de que todos faziam parte”. 

Animados pelas declarações, os agentes completaram o cerco: em casa de Isaías dos Santos Costa, sogro de Augusto Grelheiro, encontraram um caixa com livros e muitos panfletos. Um dos livros, “Os Organismos de Transportes na Revolução Social”, é da autoria de Mário Castelhano, um dos mais destacados líderes anarco-sindicalistas. O filho de Isaías, Carlos Santos Costa, declarou, por seu lado, que as bombas na posse do cunhado se destinavam a “atentados pessoais, contra autoridades sociais e outras pessoas de destaque na sociedade”. 

No entanto, não restam dúvidas das intenções revolucionárias do Comité de Setúbal: o corpo de delito não permite outra conclusão e os dois manifestos recolhidos pela polícia não deixam margens para dúvidas. O primeiro, mais doutrinário, era dirigido aos “Trabalhadores de Portugal! Operários anarquistas, comunistas, sindicalistas e sem partido!”. Assinavam-no a Confederação Geral do Trabalho, a Federação das Associações Operárias, a Comissão Inter-Sindical e o Comité das Organizações Operárias Autónomas. O segundo, em forma de panfleto, era assinado pelo “Comité Local de Setúbal da Luta Antifascista”. Denunciavam ambos a “fascização dos sindicatos”, a aflitiva crise de trabalho e a fome e apelavam à greve revolucionária.

A 17 de Janeiro, uma semana depois das primeiras prisões, o Chefe de Investigação da PSP de Setúbal produzia o seu relatório: confirmava a culpa de todos os capturados e avisava o seu Comandante de que estaria “para eclodir um movimento revolucionário de carácter comunista, com actos atentatórios a altas personalidades da situação política”. 

Não se enganava. Um dia depois, ocorria o “18 de janeiro de 1934” na Marinha Grande e em toda a Grande Lisboa e Margem Sul. O “Comité de Setúbal” – ou uma parte importante dele -, tinha sido desmantelado nessa semana que antecedeu o movimento revolucionário. Alguns dos últimos implicados foram ainda presos no Parque do Bonfim, na noite de 17 de janeiro, quando se preparavam para a ação, em reunião clandestina. 

A mão do Tribunal Militar Especial seria aqui pesada e implacável – ao contrário do que aconteceu noutros processos de implicados em “manejos revolucionários”. Os designados “presos sociais” foram sempre mais pesadamente penalizados do que os “políticos”. Augusto Grelheiro, detentor das bombas, foi condenado a 10 anos de degredo nas colónias e à multa pesadíssima de 20 mil escudos. António Augusto Quaresma, capturado em 11 de janeiro de 1934, foi solto em Angra do Heroísmo, em 26 de Setembro de 1938, local para onde tinha sido desterrado. Havia sido condenado à pena de desterro por três anos, à multa de seis mil escudos e à perda de direitos políticos por dez anos. José Bernardo, sujeito a pena semelhante, foi igualmente libertado em agosto de 1938. Bernardino Augusto Xavier, do Barreiro, só seria solto em junho de 1941. Capturado em julho de 1934, fora condenado a três anos de desterro para “local à escolha do Governo”, à multa de seis mil escudos e à perda de direitos políticos por dez anos. Dos restantes réus, dois seriam absolvidos, seis libertados nos meses seguintes (anos de 1934 e 1935) e outros quatro condenados a penas correcionais de oito a dezoito meses, depois de descontado o tempo de prisão entretanto sofrida, à perda de direitos políticos por períodos de cinco a dez anos e igualmente a penas pecuniárias.

Como noutros processos julgados no Tribunal Militar Especial, pouco foi acrescentado pelo promotor, o major António Pais de Andrade Baeta, aos autos promovidos pela polícia. O processo foi rececionado pelo Presidente em 26 de janeiro e enviado ao promotor que decidiu enviá-lo ao juiz auditor para completar as investigações. Estas desenrolam-se durante o mês de março, a cargo do oficial investigador do Tribunal, tenente Mariano Moreira Lopes. Constam de um exame pericial ao corpo de delito, composto por 61 bombas, uma pistola FN e vinte e oito balas e ainda de um “auto de investigações” em que são ouvidos o Chefe e Ajudante de esquadra que assistiram às declarações dos presos, em Setúbal. Em 23 de Março, o Promotor dava-se por satisfeito com as investigações e “promovia” que os indivíduos fossem submetidos a julgamento”. Entre as primeiras declarações dos réus e as declarações dos agentes da PSP de Setúbal no TMEL não foram encontradas contradições substanciais, pelo que o “auto de declarações” constituía o “auto de delito”. Dois meses depois, a 17 de maio, o juiz auditor, Gilberto de Beça Aragão, confirmava as notas de culpa, decidia sobre os mandados de captura aos fugidos e propunha a liberdade para alguns dos presos.

Nas prisões da Trafaria e do Aljube, os réus foram recebendo as suas acusações a 25 de maio. O julgamento ainda esperaria a marcação por mais algum tempo, por impossibilidade de captura de alguns réus, entretanto fugidos para Espanha, segundo declaração do próprio tribunal. Mesmo as libertações ocorrem de forma lenta: Álvaro Pinto Teixeira foi solto da prisão do Limoeiro em 18 de agosto. O julgamento só viria a ocorrer em 10 de outubro. 

Durante os meses que antecederam o julgamento, os reclusos foram fazendo chegar ao tribunal as relações de testemunhas, algumas contestações, bem como declarações de indivíduos ou firmas em que trabalharam, para seu abono. Ao mesmo tempo constituíam a sua defesa. Além do defensor oficioso, capitão Amândio Machado, os presos puderam escolher livremente três advogados – Domingos Monteiro, Carlos Homem de Sá e Adão e Silva. No entanto, pouco poderiam ter esperado da defesa – as declarações à polícia haviam sido recolhidas sem a sua assistência, o Tribunal tinha dado os factos apurados como provados e os dois recursos interpostos ao Supremo seriam indeferidos. Quanto às testemunhas de defesa apresentadas pelos réus, elas seriam ouvidas durante a audiência, mas sem capacidade que não fosse a de constituírem testemunhos abonatórios dos réus. À frente do Tribunal estavam dois dos juízes que mais julgamentos realizaram no TMEL, o coronel Adriano da Costa Macedo e o tenente-coronel Fernando Luís Mouzinho de Albuquerque.

Texto de Luís Manuel Farinha






Greve Revolucionária contra o Fascismo (18 de Janeiro de 1934)

A “greve geral revolucionária” de 18 de Janeiro de 1934 nasce de um crescendo revolucionário (sem retorno) do movimento sindical politizado contra a “fascização dos sindicatos” e o fim do sindicalismo livre que tinha sido pujante durante a I República.


A Ditadura Militar tinha restringido o movimento sindical reivindicativo e dissolvido mesmo alguns sindicatos que acusava de estarem comprometidos com a “revolução política e social”, como aconteceu na sequência dos movimentos reviralhistas de “3 de Fevereiro de 1927” e “20 de Julho de 1928”. Por seu lado, alguns destes sindicatos – os mais politizados – tinham conseguido passar, muitas vezes, da ação puramente reivindicativa para uma fase superior de luta contra o “capitalismo corporativo” e contra a ditadura violenta que se desenhava no horizonte desde os anos pós-guerra e, mais determinadamente, depois dos movimentos militares de “28 de Maio de 1926” e “3 de Fevereiro de 1927”.

Para os setores que, entre 1923 e 1926, ensaiaram uma solução política de “bloco das esquerdas” contra o “partido dominante” e contra as direitas de todos os matizes – incluindo as fascistas -, não havia dúvida que o regime imposto em 1933 pela Ditadura Militar era um regime fascista. Diziam-no os sindicalistas das três centrais sindicais constituídas em 1933 – a CGT (anarquista), a CIS (comunista), a FAO (socialista) -, os Sindicatos Autónomos e também, por maioria de razão, os partidos políticos que ousavam manter uma voz ativa – os comunistas (em clandestinidade), os liberais de Cunha Leal praticamente ilegalizados e os socialistas que apesar de autodissolvidos em 1933, mantiveram uma rede partidária consentida até pelo menos 1935. Apesar de se considerar vencido pela contrarrevolução – “por muitos anos!” -, Ramada Curto, o líder dos socialistas afirmava, num tom irónico, em 12 de maio de 1934, que «Quanto à diretriz política da ditadura é o fascismo, como toda a gente sabe. Um fascismo sem discursos, sem paradas, sem teatro. Um fascismo de gabinete. Não há camisas castanhas nem camisas negras. O ditador português não precisa de camisas de qualquer qualidade a apoiá-lo. Bastam-lhe as metralhadoras e as espingardas do Exército. Evita assim uma duplicação de despesas. Os camisas são caros e pesam nos Orçamentos».

“A greve geral revolucionária de 18 de janeiro de 1934”, preparada desde agosto de 1933 pelas diferentes correntes políticas e sindicais que, para o efeito, formam uma “Frente Única”, tornou-se inexorável, a partir do momento em que se entrechocaram diferentes estratégias – sindicais e políticas – na condução da linha tática e do plano de ação que devia orientar os insurretos contra a fascização da “Ditadura Nacional”. Pode dizer-se que as marcações sucessivas da sua eclosão – primeiro em novembro de 1933, depois em 8/9 de janeiro de 1934 e, finalmente, em 18 de janeiro -, são a melhor prova das enormes dificuldades de convivência entre as diferentes linhas estratégicas em presença – que, finalmente, se reduziam mais simplesmente a duas dominantes: a anarquista da CGT e a comunista, da CIS/PCP. A primeira, defendia a “greve geral revolucionária”, na linha de um sindicalismo revolucionário que acreditava na autonomia sindical e na sua capacidade de, só por si, impor a organização social que havia de suceder ao esmagamento da sociedade burguesa e capitalista. A segunda, de orientação marxista-leninista, considerava indispensável a existência de um partido político que conduzisse essa luta de emancipação dos trabalhadores e de toda a humanidade. A ineficácia da condução plural da luta libertadora, através de uma “greve geral revolucionária” levada a cabo por sindicatos era, para os comunistas, uma evidência, como a história tinha provado até aí, ao contrário do que acontecera com a vitoriosa Revolução Soviética. Bento Gonçalves, líder dos comunistas e ele próprio um organizador do “18 de Janeiro”, vai considerar que a greve não passou de uma “anarqueirada”.


Motivos muito fortes

Apesar das grandes divergências evidentes na fase de preparação, a “Frente Unida” levou por diante a “greve geral revolucionária” contra a “fascização dos sindicatos” e contra as primeiras medidas governativas fascistas. De facto, depois de aprovada a Constituição Corporativa (abril de 1933), o “Estado Novo” fez sair, em 23 de setembro de 1933, um pacote legislativo em que instituía toda a nova orgânica corporativa do trabalho (Estatuto do Trabalho Nacional, Grémios, Sindicatos Nacionais, Casas do Povo, Casas de Pescadores e o Instituto Nacional do Trabalho e Previdência). Nos meses seguintes, a legislação corporativo-fascista impunha os primeiros efeitos práticos: a greve era proibida, não se reconhecendo aos trabalhadores qualquer outra forma de organização à margem dos Sindicatos Nacionais. Ao mesmo tempo proíbe qualquer tipo de organização sindical aos funcionários públicos e municipais e outros grupos de trabalhadores, como os assalariados agrícolas, os pescadores e os domésticos. O decreto que criava os Sindicatos Nacionais estipulava que até 31 de dezembro de 1933, os sindicatos livres deviam aprovar novos Estatutos e submeter-se à organização corporativa do Estado. Sob a vigilância repressiva da Polícia de Informações, o movimento sindical foi aproveitando as assembleias, marcadas para efeito de novos Estatutos, a promover a “greve geral revolucionária”. No entanto, as duas diferentes estratégias político-sindicais em presença foram dificultando a preparação da greve. Se é verdade que só poucos sindicatos se dispuseram a aceitar a revisão dos Estatutos (57 em 754), também é verdade que algumas das classes mais ativas e poderosas (como os ferroviários da CP, do Minho e do Sul e Sueste), se mantiveram muito céticas em relação à possibilidade de uma “greve geral revolucionária”, considerando a Polícia de Informações que, no caso da CP, “o pessoal dos escritórios, tração, movimento, etc., não acompanha[va] tal aventura”.

As condições para a realização da greve geral foram sendo diminuídas durante o longo período de preparação. Na noite de 20 para 21 de novembro, foi preso Sarmento Beires e toda a rede de militantes sindicais que fazia a ligação entre o movimento sindical e os setores republicanos reviralhistas, na altura a preparar um movimento revolucionário para o qual procuravam contar com a “greve geral revolucionária”, como aconteceu no “Movimento de 20 de Julho de 1928”. As prisões sucedem-se nos meses seguintes. Em 7 de janeiro – nas vésperas de uma das datas programadas para a greve –, são descobertas bombas e presos militantes em S. Bartolomeu de Messines. A intenção dos grevistas não podia ter ficado mais escancarada. Muito grave foi a prisão do líder anarquista Mário Castelhano a 14 de janeiro. E no dia 15 são descobertas 60 bombas em Setúbal, levando à prisão de toda a organização da cidade até à noite de dia 17, vésperas da greve geral.





Apesar de todas as adversidades – e até de observações e avisos mais lúcidos como os que faz o socialista Alfredo Franco -, a “greve geral revolucionária” sai à rua na madrugada de 18 de janeiro de 1934. Os líderes terão acreditado na capacidade de tornar insurrecional um movimento sindical que, objetivamente, tinha muitas razões para manter as suas reivindicações de classe. Não terão ignorado a violência da força militar que se tinha mostrado forte e alinhada com os novos condutores da “Situação”, porque era impossível que não soubessem o que poderia acontecer, depois da brutal repressão que se tinha abatido sobre os sindicatos e os militantes das “esquerdas” desde 1926. Assistia-os, contudo, a “razão” e a forte consciência de que, podendo ser a última oportunidade do sindicalismo revolucionário sair à rua, abdicar da luta e não ousar seria a sua derrota antecipada.

Pela madrugada

O movimento eclode pelas 3 horas da madrugada do dia 18 de janeiro. São efetivos os cortes de linhas telefónicas e telegráficas nas zonas de Leiria, Lisboa, Setúbal, Évora, Portalegre e Faro ao mesmo tempo que ocorrem sabotagens de linhas de caminho de ferro em vários locais. A mais aparatosa resultou no descarrilamento de um comboio de mercadorias, junto à estação da Póvoa de Sta. Iria, por volta das 5 da manhã: das 52 carruagens, 23 ficaram parcial ou totalmente destruídas. Assinale-se ainda a explosão da Central Elétrica de Coimbra e o ataque à bomba da Estação Telegráfico-Postal da Marinha Grande. Aqui, a GNR rendeu-se e a vila foi ocupada, temporariamente, por aquele que ficou designado como o “Soviete da Marinha Grande”. Em Benfica (Lisboa) ocorrem ainda explosão de bombas no final da tarde de dia 18.

Os atos insurrecionais deviam ter sido acompanhados de uma greve generalizada, mas isso, de facto, não aconteceu. Com dimensão, apenas os corticeiros de Silves (durante 3 dias), operários de algumas fábricas de cortiça do Barreiro (durante 1 dia) e os trabalhadores do concelho de Almada (dia 18, e parcialmente a 19) realizam, de facto, paralisações significativas do trabalho. Por outros locais (Seixal, Cacilhas, Setúbal), algumas manifestações de menor dimensão mostraram como a disposição de fazer greve esteve longe de ter uma organização e uma realização desejada e à altura das exigências.

Derrota avassaladora e definitiva

O “18 de Janeiro de 1934” foi providencial para a Ditadura fascista. No dia 18 e 19 são presos centenas de sindicalistas, especialmente em Lisboa, na Marinha Grande, em Leiria e em Coimbra. Os que não conseguiram fugir (Espanha foi um dos destinos, experimentado por exemplo pelo comunista José Gregório) continuaram a ser presos nos meses seguintes, até à sua completa “limpeza”. De uma penada, o regime aniquilava as elites sindicais (anarquistas e comunistas) e deixava o caminho aberto para a única solução possível – a adesão dos trabalhadores aos “Sindicatos Nacionais”.

Por legislação especial, o Governo da Ditadura proíbe as entidades patronais de manterem os “grevistas” ao seu serviço e decreta “a greve como um ato revolucionário”, proibida por lei de setembro anterior. Como “delito político”, a greve passa a ser sancionada por Tribunais Militares Especiais (criados pelo Decreto-Lei nº 23 203 de 1932). Com o argumento de que não podia julgar rapidamente tantos “criminosos”, o Governo fascista prepara novas colónias penais (ex. Foz do Cunene, Angola) ao mesmo tempo que envia centenas de presos para a Fortaleza de Angra do Heroísmo. Deportados, sem meios defesa, os grevistas do “18 de janeiro de 1934” constituem uma das colónias mais numerosas do futuro Campo de Concentração do Tarrafal, em Cabo Verde, de onde alguns só regressam muitos anos mais tarde. Quando foram julgados, os grevistas sujeitaram-se a penas de 1 a 4 anos e a penas de desterro até 10 anos.

Os anos seguintes serão marcados por uma viva controvérsia ideológica sobre a missão dos sindicatos e a importância do partido de classe. Será uma discussão que só pode ter lugar na clandestinidade ou nas prisões. Os últimos anarquistas (como o líder José de Sousa) continuarão a defender a criação de sindicatos livres (embora ilegais), enquanto o Partido Comunista se vai empenhar em entrar nos Sindicatos Nacionais (o designado “entrismo”) para poder de dentro deles desenvolver a luta político-sindical reivindicativa e antifascista.

Autor do texto:  Luís Farinha (Ex-Diretor do Museu do Aljube Resistência e Liberdade. Investigador no Instituto de História Contemporânea da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa)


Fonte: AQUI  





Breve história da revolta operária do 18 de Janeiro de 1934

 A insurreição de 18 de Janeiro de 1934 resulta indirectamente de um longo processo de luta social e sindical pela melhoria das condições de vida da classe trabalhadora, e surge especificamente como movimento nacional de contestação à ofensiva corporativa contra os sindicatos livres, por força do recém-publicado “Estatuto do Trabalho Nacional e Organização dos Sindicatos Nacionais” em Setembro de 1933 pelo Estado Novo, regime responsável por milhares de vítimas, mortos em confrontos, prisões ou em situações de tortura, prisões em campos de concentração no continente, ilhas e colónias, perseguições, expulsões do país, degredos e deportações para as ilhas e colónias, semeando um rasto de terror entre várias gerações de portugueses.


O sindicalismo corporativo contra o qual as principais centrais sindicais lutavam obedecia assim aos seguintes princípios:

- Unicidade sindical corporativa, sendo apenas permitidos os sindicatos nacionais, resultantes da prévia aprovação pelo Governo dos seus estatutos. Os que não se submetessem e/ou não correspondessem ao modelo pretendido pelo Estado Novo seriam encerrados e dissolvidos;

- Colaboração das classes sociais com vista à harmonia do capital e do trabalho, sob a bandeira do “interesse nacional”, implicando, entre outros, a proibição da greve o do lock-out e todos os contactos com as filiações internacionais dos sindicatos;

- Controlo dos sindicatos pelo Governo, a quem cabia aprovar as direcções eleitas, podendo demiti-las, dissolver administrativamente os sindicatos ou as secções “que se desviassem dos seus fins” ou nomear comissões administrativas para dirigir os sindicatos. O Governo tinha ainda poderes de fiscalização, intervenção e orientação de toda a actividade sindical e da contratação colectiva do trabalho, através do também recém-criado Instituto Nacional do Trabalho e Previdência.


Para a grande parte das organizações sindicais era impensável a dependência do Estado e a perda de autonomia e liberdade, bem como a colaboração entre patronato e classe operária, num equilíbrio extremamente desigual de forças. Esta realidade acaba por gerar elos de união entre elas: a Confederação Geral do Trabalho (de cariz anarco-sindicalista), a Federação Autónoma Operária (socialista) a Comissão Intersindical (comunista) - filiadas em organizações sindicais internacionais - bem como alguns sindicatos autónomos, em torno de objectivos comuns, e por fim, em torno do objectivo da greve geral revolucionária de 18 de Janeiro de 1934 - a qual deveria ter irrompido em simultâneo com uma sublevação militar republicana que não chegou a acontecer.


Apesar do difícil entendimento entre as organizações sindicais, das medidas preventivas tomadas pelo Estado e da actuação da polícia (que consegue prender os principais dirigentes que se encontravam à frente de toda a preparação e articulação da revolta), o movimento sai para a rua e desenrola-se, embora desarticulado. Contudo, a falta de apoio militar e a fraca adesão e repercussão nacional condenou-o ao fracasso.


Registaram-se greves gerais de carácter pacífico em Almada, Barreiro, Sines, Silves, e manifestações operárias, mais ou menos um pouco violentas na Marinha Grande, Seixal, Alfeite, Cacilhas e Setúbal. Foram sabotadas estruturas de transportes, comunicações e de energia entre Coimbra e o Algarve (com destaque para Leiria, Martingança e Póvoa de Santa Iria), e confrontos armados com forças policiais em Lisboa e Marinha Grande - onde o movimento atingiria grandes repercussões.


Pese embora as grave situação de crise económica e social que a Marinha Grande viveu em períodos alternados nas três primeiras décadas do século XX, dos graves períodos de falta de trabalho, fome e doença, e do descontentamento do seu operariado, a presença de um forte associativismo entre a comunidade marinhense, em particular junto do operariado vidreiro, teria sido determinante na consciencialização dos valores sociais em causa e no surgimento das várias associações de classe operárias. Influenciadas pelas várias vertentes politicas e ideológicas do momento (anarquistas, socialistas e comunistas) e respectivas centrais sindicais – Confederação Geral do Trabalho, Comissão Inter-Sindical, Federação Autónoma Operária - as associações haveriam de se fundir em 1931 no Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Indústria do Vidro. Composto pelas Associações de Classe dos Manipuladores de Cristal, Associação de Classe dos Garrafeiros e o Sindicato Único dos Lapidários de Vidraria (já existentes) veio a acolher mais tarde a Associação de Classe dos Manipuladores de Vidraça.


Quando em finais de 1933 se iniciam os preparativos da insurreição e Greve Geral do dia 18 de Janeiro de 1934, o centro industrial vidreiro da Marinha Grande não ficaria de fora: em articulação com as organizações sindicais nacionais, o movimento foi liderado por José Gregório, Teotónio Martins, Manuel Baridó, António Guerra, Pedro Amarante Mendes, Miguel Henrique e Manuel Esteves de Carvalho.


O número de detidos na Marinha Grande teria ascendido no mínimo, a 131 pessoas:

- 49 detidos - libertados posteriormente ao longo do mês de Janeiro por falta de provas;

- 4 detidos - libertados em meados de Março, atendendo à sua pouca idade e ao tempo de prisão já realizado;

- 45 detidos, processados e condenados pelo Tribunal Militar Especial com penas pesadas - condenados ao desterro, com penas entre 3 e 14 anos de prisão na Fortaleza de São João Baptista em Angra do Heroísmo, e ao pagamento de pesadas multas;

- 33 presos dos quais não se encontrou referência à sua hipotética libertação ou julgamento.

“Os revoltosos da Marinha Grande, pelos alvos que haviam escolhido e pela natureza e gravidade dos seus actos, podem ter sido designados como o objecto de um castigo exemplar.

Mas o facto de o movimento ter ficado confinado a uma minoria activa e o facto de, desde a primeira hora, a imprensa ter qualificado o movimento de comunista, qualidade que os próprios comunistas se apressam a reivindicar, é como se tivessem facilitado a escolha do Governo. Seja como for, a vaga de prisões, o elevado número de condenados e sobretudo a indiscutível dureza das penas iam constituir para os sectores populares da Marinha Grande uma hecatombe.”

Fátima Patriarca, O 18 de Janeiro de 1934 na Marinha Grande, Marinha Grande, Estudos e Documentos n.º 6, Museu Santos Barosa da Fabricação do Vidro, Outubro de 1997, pp. 36 e 37.


Os revolucionários do 18 de Janeiro foram derrotados num combate em que a heroicidade não bastava para vencer a enorme desigualdade de forças, mas, como muitas vezes aconteceu na história, foi do amargo da derrota que o movimento operário revolucionário extraiu as lições para melhorar a sua organização e elevar a sua capacidade de luta.


Assinalar o 18 de Janeiro é também prestar a devida homenagem aos revolucionários dessa gloriosa jornada e à causa da liberdade e do socialismo e cujos nomes permanecerão na memória do povo marinhense.


Nesta conjuntura inicia-se assim um longo processo de luta contra o Estado Novo, contra a ditadura, a censura e o estado corporativo, pelo direito elementar à liberdade, do qual resultaram milhares de presos políticos, considerados de “especial perigosidade” - alguns deportados para a ilha de Santiago, no arquipélago de Cabo Verde, nomeadamente para a Colónia Penal do Tarrafal, conhecida como o “campo da morte lenta”, um regime prisional inspirado no modelo nazi, assente na arbitrariedade, na violência organizada, nos trabalhos forçados.


Dos 152 presos que a 29 de Outubro foram inaugurar o sinistro Campo da Morte Lenta, 57 tinham participado na jornada do 18 de Janeiro, e entre os 32 presos assassinados no Campo do Tarrafal, estavam os marinhenses Augusto Costa, assassinado em Setembro de 1937, e António Guerra, assassinado em Dezembro de 1948, já depois da derrota de Hitler e Mussolini. A estas mortes dos revolucionários do 18 de Janeiro da Marinha Grande há que acrescentar as dos Francisco da Cruz e Manuel Carvalho, a primeira ocorrida na prisão de Angra do Heroísmo e a segunda no Hospital de Leiria, na sequência dos maus-tratos infligidos na altura da prisão.

Alojados em tendas de lona que albergavam 12 prisioneiros cada, latrinas construídas com bidões de gasolina enterrados no solo, não tinham condições de higiene, água potável ou electricidade, e a alimentação era bastante deficiente. Um conjunto de factores responsável pela propagação de doenças – como o paludismo. Eram ainda submetidos a tortura e a carcereiros cruéis, numa tentativa desumana de os aniquilarem física e psicologicamente, inviabilizando qualquer hipótese de fuga.


Um dos métodos de tortura era o da “frigideira”: pequeno compartimento em betão armado com uma porta de ferro, com arejamento mínimo, onde os prisioneiros eram colocados e deixados durante dias sujeitos a condições de temperatura extremas (do dia para a noite), praticamente sem água e comida (embora fossem servidas duas “refeições” por dia).

Inaugurado, como se referiu, em 1936, acabaria por ser encerrado em 1954, reabrindo posteriormente no inicio dos anos 60 com o propósito de deter prisioneiros suspeitos de apoiarem os movimentos de libertação das colónias, encerrando definitivamente após o 25 de Abril de 1974, colocando fim ao horror vivido por muitos marinhenses, cidadãos portugueses e africanos durante o regime do Estado Novo.


Trechos do texto da exposição "Breve Retrospectiva sobre a revolta nacional do 18 de Janeiro de 1934", que esteve patente na Casa-Museu 18 de Janeiro de 1934, de 18 de Janeiro a 3 de Fevereiro de 2008.


Texto retirado de: website da Câmara Municipal da Marinha Grande