quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Viver sem telemóvel, para salvaguardar o silêncio e a

Resistir às falsas urgências e temporalidades da vida moderna;


pela defesa do silêncio, da espera e para reinventar novos modos de vida alternativos à toda poderosa velocidade moderna.

Entrevista com o sociólogo Francis Jauréguiberry, sociólogo, investigador e professor na Universidade de Pau, França.


P -Qual é razão do seu interesse relativamente às pessoas não-utentes do telemóvel?

R – Sempre estive interessado em acompanhar e estudar todos aqueles que revelam uma vontade e um comportamento de resistência aos modos e às injunções sociais. Hoje em dia, perante a injunção generalizada de que tudo é comunicacional, alguns pessoas, em pouco número, é certo, mas de uma maneira muito significativa, rejeitam cair nessa tendência e nessa moda.

P – Nem todos os não utentes são pessoas idosas, é verdade?

R – Sim, é justamente isso que é extremamente interessante. Ao contrário de uma visão tecnicista que faz dos não utentes do telemóvel pessoas retrógradas, incapazes de acompanhar as inovações, eu tenho encontrado indivíduos que estão perfeitamente integrados no espírito dos tempo presente, que têm vidas muito activas, e que não sofrem de qualquer espécie de tecnofobia, tanto mais que muitos deles têm e utilizam os computadores ligados à Internet. Ora o que se passa é que é preciso ter algo mais que a simples vontade para rejeitar a posse e o uso de um telemóvel. A motivação tem de ser, pelo menos, muito forte. Aliás, não é propriamente o telemóvel, enquanto objecto, que é recusado por essas pessoas, mas sim a temporalidade que ele implica. Com efeito, para essas pessoas a paragem, o silêncio, a espera e o diferimento não são, de todo, aspectos negativos. Com o seu procedimento essas pessoas acabam por reintroduzir uma outra dimensão temporal ligada à maturação, à reflexão e á meditação. Muitos deles receiam que a imposição da urgência, da imediatidade venham a matar a imaginação, tal como a conversa da treta poderá substituir a troca recíproca. Não querem prejudicar o compasso de espera. E há até quem diga que o telemóvel não passa de um poderoso meio de controle. E isso não só a nível profissional como ainda na própria esfera pessoal.


P – O que é que se sabe acerca das consequências psicológicas dos telemóveis?

R – É difícil responder. Estou actualmente a fazer um estudo na Califórnia sobre os chamados «burn out», isto é, todos os que se vão abaixo por efeito de uma vida demasiado apressada, cheia de stress, e que encaram o seu dia-a-dia como se fosse um combate permanente. Certamente que não terá sido o telemóvel que esteve na origem daquele desenlace, mas foi, sem dúvida, um instrumento perfeito daquela vida conturbada que viveram. Curiosamente, quando essas pessoas se vão abaixo, elas cortam com o telemóvel. E para sair dele é indispensável retirarmo-nos do ritmo temporal, isto é, da temporalidade que ele é um simples espelho, e substituí-la por uma sincronia universal em busca de uma união em tempo real de todos os ramos da grande rede. É preciso aprender a seleccionar, a dizer não, a aceitar a solidão e o silêncio. Dá para pensar o facto de serem as pessoas que renunciam ao telemóvel, aquelas que atraem e são motivo dos nossos estudos.


(tradução da entrevista publicada no Le Monde2 de 19 de Fevereiro de 2005)